Uma vez eu fui a uma festa de Seu Zé Pilintra e lá vi muita gente colocando garrafa de cachaça aos pés dele de qualquer jeito. Ele num canto mal iluminado, parede suja, sem a devido atenção que merecia. Pensei:
"Qual a necessidade disso? Por um acaso o Seu Zé Pilintra vai beber tudo isso?"
Eles riam, grande parte estava alcoolizada. Fiquei muito sem graça, pois não estava acostumado com aquela situação. Eu não bebia, não bebo aliás.
Seu Zé Pilintra recebia cachaça de uma forma tão irresponsável, tão sem respeito que fiquei indignado. Seu Zé não merecia isso.
O zelador da casa estava abraçado com duas filhas de santo. Beijada o rosto de cada uma. Depois saia com elas para um cômodo particular se é que me entendem...
Era uma casa tão promíscua, tão desrespeitosa que me arrependi de estar ali. Eu só fui porque meu amigo havia me convidado para ir à casa de santo do zelador dele. Se arrependimento matasse...
Mas percebi que era pra eu ter ido lá e ter presenciado tamanha baixaria.
Quando cheguei na minha casa, tomei um belo de um banho bem gelado. Ainda passava pela minha cabeça aquela palhaçada que presenciei. Pensei:
"Por que fazem isso? Por que desrespeitam as entidades, por que tratam o Seu Zé como um bêbado qualquer e sem valor? Seu Zé Pilintra não merecia aquilo, não merece!"
Fui dormir.
Sonhei com o Seu Zé Pilintra aquela madrugada. Ele pediu para mim, que eu fizesse uma firmeza para ele, que ele iria me guiar e me proteger até o último dia de minha vida. Disse que aquele Zé que eu havia visto não era ele, era uma representação dele, mas que ele não habitava ali. Disse que ele frequenta casas que o respeitam, que o tratam com dignidade, zelo, carinho e compromisso com o espiritual.
Ele disse assim:
"Meu filho, eu sou malandro antigo. Bebo sim, minha cerveja, me divirto, jogo, eu Sàngó, sou vivido na vida, na noite, na malandragem, mas não sou um qualquer. Não sou um bêbado que enche a cara de cachaça e as pessoas jogam aos meus pés garrafas de pinga. Sou de respeito.
Sou Zé Pilintra e não Zé mané. Aquela casa não tem a minha malandragem, não tem o meu AXÉ, pois ali ninguém tem fé, você mesmo viu. Não adianta comprar uma imagem me representando e não saber me tratar bem. Adianta pra quê? Chamar atenção? Eu estou aonde sou bem tratado, sou bem quisto. Não se preocupe. Vá e faça uma firmeza para mim, você saberá o seu propósito."
Assim que amanheceu eu fiz tudo o que Seu Zé Pilintra havia pedido. A minha firmeza foi feita com tanto amor e com tanta FÉ que senti Seu Zé Pilintra perto de mim. Cantei para ele, fiz tudo com muito respeito. Naquela época eu estava desempregado. Havia entregue um currículo mês passado.
Não demorou nem cinco dias e meu celular tocou. Uma moça me ligava me chamando para uma entrevista de emprego. Eu fui. Passei nas três etapas e no dia seguinte ela me ligou confirmando que o emprego era meu.
Vocês entenderam?
Seu Zé Pilintra havia me ajudado com aquilo. Eu, com 40 anos de idade e empregado numa sociedade que raramente contrata pessoas mais velhas? Era AXÉ do Seu Zé.
Foi a partir desse dia que Seu Zé Pilintra passou a viver na minha vida. Sempre!
Ah, sobre a casa que zombavam dele e faziam coisas nojentas?
Foi fechada!
Aquele Seu Zé Pilintra que tratavam mal, deixavam em um canto escuro, em um canto sujo e sem atenção, eu havia comprado do antigo dono já que ele estava sem dinheiro.
Hoje, aquele Zé Pilintra está na entrada de minha casa sendo muito respeitado como ele merece.
Saravá Seu Zé Pilintra!
Salve a Malandragem!